TÍTULO: O DESAFIO DA SAÚDE MENTAL EM INDIAROBA (SE)
ESPECIALIZANDO: RODRIGO MOTA GOMES
ORIENTADOR: RICARDO HENRIQUE VIEIRA DE MELO
Dentre os desafios que o SUS apresenta, a saúde mental se enquadra em uma das mais desafiadoras a ser ofertada. Por vários aspectos, seja pela escassez de profissionais especializados na área, seja pela falta de conhecimentogeral da população a cerca da saúde mental.
Ao chegar a minha Equipe de Saúde da Família (ESF) percebi que, assim como em qualquer outra ESF, existiam muitos usuários de psicofármacos: benzodiazepínicos, antipsicóticos, anticonvulsivantes, antidepressivos, estabilizadores de humor. Com o decorrer do tempo os agentes de saúde (ACS) solicitavam renovação de receitas para esses pacientes sem passar pela consulta médica. Ao analisar os prontuários dos usuários, notei que muitos apresentavam apenas a prescrição dos medicamentos. Então solicitei aos ACS que começassem a marcar consultas para o paciente passer por uma avaliação médica e assim ter sua receita renovada, ou alterada ou até encaminhar a um segundo profissional.
Os próprios ACS tinham uma lista de pacientes que faziam uso desses psicofarmacos, porém a lista não era organizada, tendo falta principalmente da medicação, dosagem e posologia da medicação em uso.
O fato da ESF ser de zona rural, tendo 5 povoados distantes um do outro, dificulta bastante termos reuniões com toda a equipe, temos apenas uma reunião mensal com a equipe completa. Então em conversas particulares com os ACS chegamos a elaborar uma lista, mais completa, desses pacientes. O que eles mais relataram foi a questão da renovação da receita, muitos alegaram que alguns pacientes pediam renovação todos os meses, outros passavam 4…5 meses para pedir outra receita, uns nunca tinham ido ao médico (desde quando começaram a trabalhar como ACS).
Para tentar sanar essa dificuldade elaborei uma lista controle, onde cada ACS colocaria o nome, idade e medicação do paciente e a data da consulta, ou renovação de receita. Ficou pactuado com todos que a prescrição da medicação seria para cada dois meses, caso houvesse necessidade de mudar o período, eu mesmo entraria em contato com o ACS e o informaria. A consulta com o medico teria que ocorrer no máximo a cada seis meses.
Exemplo:
NOME/IDADE (DN) / MEDICAMENTOS |
DATA |
DATA |
DATA |
Sr._________, 50 anos (__/__/____) |
09/05/18 Renovação + Consulta |
05/07/18 Renovação |
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Diazepam 10mg 1x dia / Amtriptilina 25 mg 3 x dia/ |
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Haloperidol 5mg 1x dia |
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Sra._________, 40 anos (__/__/____) |
27/06/18 Renovação |
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Carmabazepina 200mg 2x dia / Clonazepam 2mg 1x dia |
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Para ter um controle dos pacientes de todos os ACS elaborei outra planilha onde mostraria o nome e o tipo de psicofarmacos que o paciente estaria usando, assim teríamos um controle mais amplo da quantidade de pacientes que usam benzodiazepínicos ou antidepressivos, por exemplo:
PACIENTE |
Sr. _______ |
Sra. ________ |
MEDICAMENTOS |
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BENZODIAZEPÍNICOS e ANSIOLITICOS Diazepam / Bromazepam / Alprazolam / LorazepamClonazepam |
Diazepam |
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ANTIPSICÓTICOS Quetiapina / Risperidona / Haloperidol / Clorpromazina Levomepromazina |
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Haloperidol |
ANTICONVULSIVANTES Carbamazepina / Valproato / Pregabalina |
Carbamazepina |
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ANTIDEPRESSIVOS Escitalopram / Sertralina / Citalopram / Fluoxetina / Amitriptilina |
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ESTABILIZADORES DE HUMOR Fenobarbital / Carbonato de Lítio |
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Fenobarbital |
OUTROS |
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Acreditamos que com essas duas planilhas conseguiremos ter um controle melhor dos usuários portadores de alguma patologia mental. O objetivo é que ela seja atualizada durante as reuniões mensais com equipe. Percebemos que se tivéssemos um computador para a equipe, em alguma unidade, a atualização seria mais fácil e a chance de perda dos dados seria menor.
Em relação à organização da saúde mental no município de Indiaroba/SE, infelizmente é bem precária. A cidade não oferece o NASF nem o CAPs. Não apresenta nenhum profissional especializado em saúde mental (psiquiatra ou psicólogo, por exemplo). Em conversa com a gestão municipal, eles afirmaram que estão trabalhando para que seja implementado um NASF no município até o final do ano, porem não souberam informar quais profissionais iriam ser contratados para o núcleo. O município apresentava uma espécie de convênio com um psiquiatra em outro município, porém há cerca de 4 meses tal convenio foi cancelado e hoje o município não apresenta nenhum professional na psiquiatria para as equipes de saúde da família referenciar, ficando a cargo do medico da equipe tratar o usuário ou o próprio conseguir uma consulta com o professional na rede privada.
Há cerca de oito meses, a pedido de familiares, a ESF realizou uma visita domiciliar a uma usuária de 74 anos de idade que residia sozinha em sua casa. Porém a queixa que a família fez a equipe era que a senhora X, “via qualquer coisa na rua, levava para casa e guardava”. Relataram que eles mesmos chamaram a vigilância sanitária para fazer “uma limpa” na casa. Ao realizar a visita constamos que a Sra X Morava numa casa onde não existia geladeira, fogão, cama. E que ela guardava pedaços de madeira, cocos, cadeiras, panos, pedras e muitos objetos desnecessários.
Durante a conversa com a usuária questionei sobre o motivo de ela guarder tanto objeto em casa a ponto de não apresentar nem um lugar para ela dormir de maneira confortável. Ela simplesmente respondeu que tudo que ela tinha em casa poderia ter alguma serventia alguma hora. Questionei sobre não ter um banheiro com vaso sanitário limpo, um fogão, uma geladeira. Ela falou que não sentia falta, pois tinha uma espécie de fogão a lenha no quintal da residência e não sentia necessidade de geladeira, poistinha armários para guardar os alimentos. Em relação às necessidades, eram realizadas no banheiro, pois ele se encontrava sempre limpo.
Ao conversar com a família sobre a patologia da Sra X informei que se tratava de um transtorno psiquiátrico chamado de Transtorno de Acumulação e que necessitava de acompanhamento psiquiátrico e principalmente acompanhamento psicológico. Expliquei que se fosse feita a “limpeza” sem antes conversar com a paciente, mostrando a necessidade de realizar umalimpeza e de retirar aquilo que não tem utilidade, tal attitude poderia ser prejudicial a saúde da Sra X.
Na ausência de Psiquiatras e psicólogos na rede, resolvemos conversar com a assistência social da secretaria de saúde para intervir na situação. Então a ESF (medico, enfermeira e o ACS) com a assistente social, em conversa com a paciente e os familiars explicaram a necessidade de fazer uma limpeza na casa e retirar alguns objetivos que não tinham mais utilidade. A paciente aceitou então foi marcado, com a vigilância sanitaria, um dia para a realização da limpeza.
No dia da limpeza necessário uma carreta para levar o que tinha dentro da casa. A limpeza da casa durou um dia todo, foi retirado muitos pedaços de madeira, cocos, cadeiras, pano e também ratos mortos. Orientamos a família para sempre ir a casa da sra X e observar se ainda continua acumulando objetos desnecessários. Em caso positivo, orientamos para que a família sempre converse com ela para que seja retirado o objeto a fim de não chegar ao ponto de antes.
Hoje a Sra. X está sendo acompanhada rotineiramente pela ESF tendo visitas regulares para análise do problema mental e também de outras patologias clínicas que foram descobertas como parasitoses e hipertensão arterial sistêmica. Ofertamos também acompanhamento odontológico. A família conseguiu comprar geladeira, fogão, cama e construiu banheiro, realizou a pintura da casa e rotineiramente freqüenta a casa da Sra X não só para observar o curso da patologia mental, mas como também para socializar, integrar a Sra. X na família e na comunidade.
Ponto(s)