2 de agosto de 2018 / SEM COMENTÁRIOS / CATEGORIA: Relatos

Título :Atenção à Saúde Mental da Estratégia de Saúde da Família Equipe Nazaré Mineiro, Município Laranjal do Jari/AP

Especializando: Mineylis Dominguez Brizuela 

Orientador: Cleyton Cézar Souto Silva   

No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS), segundo a Política Nacional de Atenção Básica, tem, na estratégia de saúde da família (ESF), seu modelo de Atenção Primária à Saúde (APS) – ou atenção básica, como também é designado este nível do sistema de saúde nas políticas públicas brasileiras. A estratégia de saúde da família é implementada por meio de uma equipe de saúde da família formada por: um(a) médico(a), um(a) enfermeiro(a), um(a) técnico(a) de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS) em número proporcional ao número de pessoas atendidas (no máximo, 12 ACS por equipe; no máximo, setecentos e cinquenta pessoas por ACS). Esta equipe é responsável por oferecer serviços de APS à população de um determinado território delimitado geograficamente, levando em conta, também, aspectos culturais, econômicos e de acessibilidade à equipe, entre outros.  (BRASIL 2011)

Em Saúde mental e atenção básica: o vínculo e o diálogo necessários, aponta-se que a saúde mental deve ser organizada segundo um modelo de rede de cuidados, do qual o CAPS não é o único dispositivo, somando-se a eles, entre outros, a atenção básica. Em municípios com menos de vinte mil habitantes, a rede de saúde mental pode ser estruturada a partir das unidades de atenção básica. Três eixos são descritos para organização da saúde mental na atenção básica: (1) apoio matricial às equipes de atenção básica; (2) formação como estratégia prioritária para inclusão da saúde mental na atenção básica; (3) inclusão da saúde mental no sistema de informações da atenção básica. (BRASIL, 2013)

A Atenção Básica é considerada a porta de entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive das pessoas que demandam um cuidado em saúde mental. Quando os problemas não são resolvidos neste ponto de atenção, os usuários são encaminhados para outro ponto da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), cuja finalidade é a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do consumo de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do SUS (BRASIL, 2011).

Souza e Rivera (2003), realizaram uma revisão bibliográfica nacional sobre o tema da inclusão das ações de saúde mental na atenção básica. Tomando como meta os objetivos da reforma psiquiátrica, os autores citam o CAPS como equipamento sanitário ícone deste processo, mas indicam a integração da saúde mental na atenção básica, baseada nas três diretrizes do documento Saúde mental e atenção básica como caminho fundamental para ampliação da atenção psicossocial no Brasil. Também analisam as semelhanças entre os princípios que norteiam tanto as ações de saúde mental quanto a atenção básica: a articulação de conhecimentos e práticas, o acolhimento dos usuários; a responsabilização pela clientela atendida no território; o estabelecimento de vínculos entre os sujeitos envolvidos; e a integralidade do cuidado

Partimos da compreensão ampliada de saúde, a qual é definida pela OMS como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”; aliada abordagem psicossocial de saúde, que engloba “não só as questões orgânicas e psicológicas envolvidas, mas também os aspectos sociais, políticos, econômicos, legais e culturais inerentes a esse fenômeno, além das consequências físicas, psíquicas e sociais da mesma” (PRATTA; SANTOS, 2009, p.208).

Em 2011, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) é instituída como estratégia de atenção à saúde mental no âmbito do SUS. Sua finalidade é “a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas”. A RAPS reúne os diversos equipamentos públicos envolvidos nos cuidados à saúde mental, atribuindo-lhes diferentes responsabilidades e apontando diretrizes de operacionalização e integração. A RAPS é composta: pela ESF, CAPS, Núcleos de Apoio à Saúde da Família, serviços de urgência e emergência, leitos hospitalares psiquiátricos, serviços de residência terapêutica, programa “De volta para casa”, centros de convivência e comunidades terapêuticas. Estes serviços foram vinculados aos seus diferentes componentes: atenção básica em saúde, atenção psicossocial especializada, atenção de urgência e emergência, atenção residencial de caráter transitório, atenção hospitalar, estratégias de desinstitucionalização, reabilitação psicossocial (BRASIL, 2011).

No município Laranjal do Jari, Edo Amapá, a rede é composta pelos seguintes serviços e equipamentos: Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), um Centro de Referência de Atenção Psicossocial(CAPS). Quando o usuário necessita de atendimento especializado em saúde mental, álcool e outras drogas é referenciado para os diferentes pontos da rede local.

O usuário com sofrimento ou transtorno mental chega a nossa UBS através de demanda espontânea ou agendamento. A equipe de saúde realiza o acolhimento de forma adequada e humanizada, e nessa primeira abordagem identificam-se quais profissionais serão solicitados para o atendimento. Após a avaliação define-se o plano terapêutico. Quando necessário, o indivíduo é referenciado para outro ponto de atenção da RAPS da região de saúde. Quando ocorre esse encaminhamento é realizada a contra-referência, compartilhando o cuidado entre os serviços de saúde.

Em nossa área contamos com 112 usuários que fazem uso de benzodiazepínicos, anticonvulsivantes, antidepressivos antipsicoticos e estabilizadores de humor, com 15 usuários identificados e em fases de reabilitação de drogas e álcool; chegamos a esse número após a realização de diversas reuniões de toda a equipe em conjunto com o professional de psicologia que consulta na UBS. Não foi fácil, pois eram muitas ideias de como faria esse levantamento, mas chegamos a uma ideia comum.

Se determinou que nosso trabalho estaria dirigido em base a vários  importantes passos, por exemplo: o primeiro passo refere-se ao desenvolvimento de um instrumento feito em conjunto pela equipe onde seria registrado o nome do indivíduo, idade, endereço, diagnostico, se tem acompanhamento pela equipe; se foi encaminhado ou não aos distintos pontos da rede; se consume alguns tipo de medicamento controlado.

 No segundo passo os agentes comunitários de saúde (ACS), nas visitas domiciliares diárias, iriam colher esses dados, além dos dados escolhidos nas consultas de agendamentos e demandas espontâneas; e um terceiro passo, entre todas essas pessoas com dificuldade de deambular, o ACS iria agendar uma visita domiciliar, iriam passar por uma consulta do médico e do enfermeiro, com isso conheceríamos cada paciente e poderíamos traçar uma linha de cuidados, acionando quando precisasse o NASF-AB.

Foi elaborada também uma planilha (anexo 6) com os seguintes dados: acesso e agendamento de consultas de pessoas com sofrimento ou transtorno mental; identificação e acompanhamento dos casos mais graves; registro dos usuários de álcool, crack e outras drogas; registro dos usuários em uso crônico de ansiolíticos e antidepressivos; se tem acompanhamento pelo clinico geral, enfermeiro ou psicologista da unidade; e se foi referenciado para os distintos pontos da rede de saúde mental. Para assim registrar as informações solicitadas pelo Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), que tem como objetivo a ampliação e a melhoria da qualidade da atenção básica (BRASIL, 2015),

O cuidado em saúde mental realizado na unidade é norteado por diversas ferramentas, como: acolhimento, escuta qualificada, acesso avançado e abordagem familiar. O acolhimento é um dispositivo fundamental para formação do vínculo e para a prática de cuidado entre o profissional e usuário. É um espaço de escuta a usuários e das famílias e possibilita a criação de recursos individuais e coletivos de cuidado (BRASIL, 2013).

O acesso avançado possibilita o atendimento em tempo hábil, reduzindo o tempo de espera por uma consulta médica (VIDAL, 2013). Um dos instrumentos utilizados pela equipe na abordagem familiar é a visita domiciliar, onde é possível identificar quem são os cuidadores da pessoa com sofrimento ou transtorno mental e como são realizados os cuidados, as dificuldades e soluções para possíveis problemas, a rede de apoio da família, entre outros.

Em uma das  reuniões  da equipe da UBS Equipe e o NASF-AB, que teve como objetivo a discussão sobre um caso clínico, foi priorizada a construção de um Projeto Terapêutico Singular (PTS). Trata-se de um relato de experiência, elaborado a partir da vivência na ESF Nazaré Mineiro, de um usuário  masculino, 52 anos, branco, casado, natural e procedente de Amapá , trabalhador da agricultora, no cultivo de castanha do Para, motivo pelo qual encontrasse um período de 3 semanas “dentro do mato”, longe da cidade.

QP: pirose e dispepsia, associadas a ingesta de aproximadamente 2 litro de cachaça-dia e cerveja ocasionais (nos finais de semana), 5 litros por dia, há 38 anos.

HDA: consumo de grandes quantidades diárias de cachaça e cerveja regularmente desde os 14 anos de idade, diversas ocasiões de cessação, o maior período foi de 9 meses. Em alguns episódios experimentou sintomas de síndrome de abstinência (tremores, mal-estar, sensação de morte iminente). Há aproximadamente 2 anos iniciou com sintomas dispépticos e pirose, aos quais atribui piora com a ingesta alcoólica (um dos motivos de ter reduzido de 4 para 2 litros cachaça/dia).

HMP: Hipertensão Arterial Sistêmica a 5 anos, sim cumprir com o tratamento indicado. Litíase Renal diagnosticada a 2 anos.

H.Familiar : pai era alcoolista, bebia cachaça. O irmão mais velho era alcoolista e faleceu aos 39 anos de complicações hepáticas. Mãe faleceu por complicações da asma. Tem 2 irmãs mais velhas, apenas uma de 60 anos é alcoolista desde os 18 anos. Tem dois filhos hígidos.

O usuário procurou nosso posto de saúde acompanhado pela esposa que fala que as vezes tornasse agressivo e sem paciência, além dos episódios de vômitos frequentes, inapetência, e perda de apetite.

Nesse primeiro dia de visita em consulta por meio do acolhimento foi oferecido um espaço de escuta à usuário de modo que ele se sentisse seguro e tranquilo para expressar suas aflições, dúvidas e angústias, e que ele conhecesse que a UBS está disponível para acolher, acompanhar e se o caso exigir, cuidar de forma compartilhada com outros serviços. Também foram indicados exames laboratoriais e ultrassonografia, e encaminhado para nosso profissional do NASF, psicólogo, quem consulta as quintas feiras de manhã. Com o desejo por parte do paciente de parar de beber.

Depois de ser avaliado pelo psicólogo, foi encaminhado para o centro de atenção psicossocial, recebeu-se a contra-referência do centro de atenção de saúde mental, esclarecendo o diagnóstico do paciente, o tratamento prescrito pelo psiquiatra, e a continuidade de seu acompanhamento pela equipe da unidade e do NASF para manter seguimento do tratamento psiquiátrico pelo CAPS do município, para uma melhor articulação com o CAPS, o NASF e a UBS para o seguimento ao paciente.

Nossa equipe determinou a realização de um plano de atividades em referente a este tema, realizando distintas ações de promoção de saúde, como palestras em grupos de adolescentes e adultos que são identificados como possíveis consumistas de álcool ou drogas, e outras doenças de saúde mental.

Espera-se desta atividade ações reflexivas por parte dos profissionais da Equipe, para   uma melhor organização no atendimento da dinâmica da saúde mental na ESF da unidade, tratando as pessoas com problemas mentais em sua própria realidade, levando apenas ao CAPS os casos mais necessitados, diminuindo, assim, a sobrecarga desse serviço e garantindo uma atenção de qualidade nos distintos setores da rede de saúde de nosso município.

As principais dificuldades percebidas nesta atividade foi, primeiramente, o baixo nível sociocultural de nossa população, e onde torna-se complicado o trabalho de todos os professionais da saúde, quando tem que promover mudanças de estilos de vida saudáveis, diferentes ao que encontrasse enraizados desde séculos anteriores, mas a equipe da ESF Nazaré Mineiro, propõe um plano de vida mais saudável e de ótima qualidade para nossa população.

O que a equipe aprendeu nesta microintervenção é que o vínculo e o diálogo entre profissionais de saúde são necessários para o estabelecimento de redes de apoio e integração no tratamento, também nos fez refletir sobre a necessidade de reorganizar o processo de trabalho, já que necessitou de uma maior articulação entre os profissionais envolvidos. A realização dessa atividade trouxe impactos positivos para os profissionais que participaram e também para os usuários.

 

Referências

 

-OMS. Organização Mundial de Saúde. Transtornos devido ao uso de substâncias. Em Organização Pan-Americana da Saúde & Organização Mundial da Saúde (Orgs). Relatório sobre a saúde no mundo. Saúde Mental: nova concepção, nova esperança Brasília: Gráfica Brasil, 2001.

-PRATTA Elisângela Maria Machado; SANTOS, Manoel Antonio dos. O Processo SaúdeDoença e a Dependência Química: Interfaces e Evolução. Psicologia: Teoria e Pesquisa Abr-Jun 2009, Vol. 25 n. 2, pp. 203-211. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ptp/v25n2/a08v25n2.pdf

-BRASIL. Politica Nacional de Promoção da Saúde. Brasília: Ministério Público, 2006.

-BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica: Saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 176 p.

 

 

ANEXO 6

 

 

 

                      PLANILHA DE ACOMPANHAMENTO DE SAÚDE                                                                        

                                         MENTAL E NEUROLOGICA

                       ESF NAZARE MINEIRO /LARANJAL DO JARI /AP.                                                                                                                                                

 

#

NOME COMPLETO

IDADE

SEXO

   DIGNOSTICO

                     TRATAMENTO

 

BENZO

 

DIAZEPI

 

NICOS

ANTI-

 

PSICO

 

TICOS

ESTABI

 

LIZADO

 

RES DE

 

HUMOR

ANTI

 

COVUL

 

SIVAN

 

TES

ANTI

 

DEPRE

 

SIVOS

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                                                                                                                     

 

ATENDIMENTO

ENCAMINHAMIENTO

AGENTE COMUNITARIO

CLINICO

 

GERAL

ENFER

MEIRO

PSICO

LOGO

ODONTO

LOGISTA

HOSPITAL

NASF

CAPS

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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