23 de julho de 2018 / SEM COMENTÁRIOS / CATEGORIA: Relatos

ACOLHIMENTO: DIREITO MÍNIMO NA ATENÇÃO HUMANIZADA

 

ESPECIALIZANDA: MICHELLE ALBANO FERREIRA

ORIENTADORA: DANIELE VIEIRA DANTAS

 

Ao longo dos anos observamos mudanças ocorreram nos modelos de atendimento na Atenção Primária a Saúde (APS), todas elas com o objetivo de prestar um atendimento mais aproximado ao preconizados pelos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre essas mudanças, o acolhimento tem sido um elemento fundamental no atendimento ao usuário uma vez que proporciona um acesso facilitado ao serviço bem como a continuidade do cuidado prestado.

De fato, há muitos anos o acolhimento é citado dentro da atenção básica, no entanto, nos últimos anos observamos um maior interesse em se por em prática o exercício de acolher gerando assim uma sistematização mais organizada nesse ato. E isso tem sido importantíssimo na criação de um vínculo de confiança entre prestadores de cuidados e usuários.

No momento em que um usuário procura atendimento e desse sai com suas necessidades ouvidas e de preferência atendidas, o mesmo cria uma confiança no serviço, passando a acreditar que seu acesso aos serviços será garantindo. Assim, terá maior interesse em retornar para dar continuidade ao cuidado, fortalecendo o elo de ligação com o serviço.

A Unidade de Saúde da Família (USF) Bom Pastor, na qual estou inserida, já tem estabelecido o acolhimento há mais de 3 anos e, mesmo ainda com falhas, tem sido eficaz em atender a necessidade da grande maioria dos usuários.

O atendimento em nossa USF ainda se dar em sua maioria pelas consultas e serviços agendados, sejam elas para médicos, enfermeiras, dentistas e serviços como curativo, atendendo assim de forma programada (Demanda Programada). Porém todos os profissionais reservam parte de seus atendimentos para possíveis Demanda Espontânea, as quais são selecionadas a partir do acolhimento realizado na Unidade.

O fluxo de marcação se inicia após a entrada do usuário na USF, o qual é recebido na recepção preferencialmente pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Na maioria dos casos, os usuários comparecem apenas com intuito de marcar consulta para uma data posterior, o que é feito pelo agente de acordo com a disponibilidade das vagas e conveniência para o paciente. Nesse ponto, é importante ressaltar que conseguimos superar o modelo no qual havia formação de enormes filas para conseguir uma vaga para atendimento seja ele qual for.

No momento em que a necessidade relatada exija de um atendimento mais imediato, que não possa aguardar para um próximo dia, o usuário é então encaminhado para uma consulta com a enfermeira, a qual realizará uma espécie de triagem. Nesse atendimento a profissional pode solucionar tais necessidades ou se identificar a necessidade de uma complementação no atendimento, a mesma direciona o usuário para outro profissional (médico, dentista, técnico de enfermagem). Esse atendimento complementar pode ainda ser realizado no mesmo momento, ou ainda programado para um outro momento, a depender da avaliação feita pela enfermeira que estabelecerá a urgência ou não de atendimento. Aqui vale ressaltar que não se trata de um fluxo “engessado”, o que nos permite abrir algumas exceções. Por exemplo, em dias nos quais a demanda de pacientes agendados não é tão intensa, é possível atender pacientes em demanda espontânea que não se enquadrem como urgência e ate que não tenham passado pela triagem com a enfermeira. Lembrando que, o fluxo do acolhimento serve para otimizar o atendimento em situações cotidianas, que em sua maioria é marcado pela intensa demanda de atendimentos, porém tudo que venha a facilitar o acesso dos pacientes aos serviços é bem tolerado.

Assim tem funcionado em nossa unidade, porém, como citado no início do texto, ainda não podemos dizer que somos perfeitos. Primeiro porque sabemos que há uma tendência mais atual que preconiza o não agendamento de consultas, priorizando assim a demanda espontânea. Em nossa realidade isso ainda seria bem complexo. Pois se deixarmos a agenda com vagas abertas diariamente, voltaríamos a ter a tão temida “fila pra conseguir pegar ficha” todos os dias. Fato já superado em nossa unidade.

No entanto, nem sempre a USF conseguiu funcionar dessa forma. Até pouco mais de seis meses a unidade não dispunha de profissionais médicos. Lógico que isso não impede que o acolhimento fosse realizado, porém ele não conseguia de fato ser efetivo no momento em que o usuário necessitasse de um atendimento complementar. Isso fragilizava e muito o elo entre serviço e usuário, pois os usuários sabendo que não teriam suas necessidades atendidas muitas vezes não buscavam o atendimento, quebrando assim também a continuidade do cuidado.

Outro ponto que ainda não foi solucionado e que prejudica muito a continuidade do cuidado é a falta de insumo e medicamentos. Infelizmente muitos procedimentos e inclusive tratamentos deixam de serem realizados na USF por total falta dos materiais necessários. Precisamos encaminhar pacientes para Unidade de Pronto Atendimento (UPA0 para aplicação de medicações intramuscular simplesmente pela falta de tais medicações na nossa Unidade. Por vezes não há como realizar curativo por falta de materiais básicos com gazes e luvas. Inclusive procedimentos médicos e odontológicos simples também são encaminhados. Todos esses fatores diminuem a credibilidade do serviço, deixando o usuário susceptível a abandonar seu acompanhamento, além de sobrecarregar outros serviços.

Outra grande dificuldade que encontramos está na cultura da população que por vezes não compreende o que realmente é urgência e necessita de atendimento imediato e o que não, forçando assim um atendimento que poderia perfeitamente ser realizado em um segundo momento.

Como citado no inicio do texto, muitas mudanças estão em curso. E sabemos que a mais nova tendência fala a favor de se preconizar os atendimentos por demanda espontânea deixando de lado os famosos agendamentos. Isso com certeza requer um serviço de acolhimento muito bem elaborado que seja resolutivo em prol do usuário e que não sobrecarregue os profissionais.

Acreditamos que apesar de estarmos longe ainda dessa realidade, nosso modelo atual tem sido resolutivo na maioria dos casos e que muito antes de mudarmos um modelo que bem ou mal tem dado certo, necessitamos conscientizar a população que estamos a disposição para melhor atendê-los, mas que necessitamos da compreensão deles também pra somente assim fortalecermos um serviço que é de todos.

 

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