20 de agosto de 2018 / SEM COMENTÁRIOS / CATEGORIA: Relatos

TÍTULO: ACOLHMENTO NA ATENÇAO BÁSICA: NECESSIDADE DE SEU           APERFEIÇOAMENTO.                                    

ESPECIALIZANDO: HUMBERTO REINALDO LABRADOR RODRIGUEZ.

ORIENTADOR: MARIA BETÂNIA MORAIS DE PAIVA.

COLABORADORES: MERLINDE SARMIENTO FERNANDES.

 

            Existem várias definições de acolhimento tanto nos dicionários quanto em setores como a saúde. A existência de várias definições revela os múltiplos sentidos e significados atribuídos a esse termo, de maneira legítima, como pretensões de verdade. Ou seja, o mais importante não é a busca pela definição correta ou verdadeira de acolhimento, mas a clareza e explicitação da noção de acolhimento que é adotada ou assumida situacionalmente por atores concretos, revelando perspectivas e intencionalidade. Nesse sentido, poderíamos dizer genericamente que, o acolhimento é uma prática presente em todas as relações de cuidado, nos encontros reais entre trabalhadores de saúde e usuários, nos atos de receber e escutar as pessoas, podendo acontecer de forma variada. Em outras palavras, ele não é, a priori, algo bom ou ruim, mas sim uma prática constitutiva das relações de cuidado. Sendo assim, além de perguntar-se, em determinado serviço, há ou não acolhimento, talvez seja mais apropriado analisar como ele se dá. O acolhimento se revela menos no discurso sobre ele do que nas práticas concretas (BRASIL, 2012).

          A Política de Humanização da Atenção e da Gestão (PNH) é uma iniciativa inovadora no Sistema Único de Saúde (SUS). Criada em 2003, com objetivo de qualificar práticas de gestão e de atenção em saúde. Uma tarefa desafiadora, sem dúvida, uma vez que na perspectiva da humanização, isso corresponde à produção de novas atitudes por parte de trabalhadores, gestores do SUS e usuários, de novas éticas no campo do trabalho, incluindo o campo de gestão e das práticas de saúde, superando todos os paradigmas e desafios do cotidiano do trabalho (BRASIL, 2010).

A implantação da Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS, em 2004, propôs a humanização como norteadora das práticas de saúde em todas as instâncias do SUS. O eixo principal desta política é o acolhimento, que segundo o Ministério da Saúde (MS) “é um modo de operar os processos de trabalho em saúde, de forma a atender todos que procuram os serviços de saúde, ouvindo usuários e assumindo uma postura capaz de acolher, escutar e dar respostas mais adequadas aos usuários”. (BRASIL, 2006).

O acolhimento constitui um mecanismo de ampliação/facilitação do acesso além de ser um dispositivo de (re)organização do processo de trabalho em equipe (BRASIL, 2011, p. 21-22).

Através do acolhimento espera-se desempenhar o exercício dos princípios do SUS de universalidade e equidade na relação entre serviços de saúde com os usuários (CAMPOS et al, 2010). Ele não se limita apenas no ato de receber, mas também a uma sequência de ações e modos que compõem o processo de trabalho em saúde (MAMUMOTO, 1998). O acolhimento propõe que seja organizado o serviço de saúde de forma que o usuário seja o centro, partindo dos princípios: atender todas as pessoas que procuram os serviços de saúde; reorganizar o processo de trabalho, saindo do modelo médico-centrico para equipe multiprofissional; aprimorar a relação entre usuário e equipe de saúde (FRANCO et al. 1999).

Um acesso organizado e um acolhimento bem feito são de suma importância para uma boa prestação de serviço no atendimento em saúde. Porém, a nossa realidade mostra que ainda trabalhamos de forma inadequada. Segundo Silva Júnior (2001, p.81) “… é necessário tratar de forma humanizada e dar respostas individuais e coletivas a todas as pessoas que procuram o serviço; discriminar riscos, urgências e emergências; gerar informações que possibilitem a leitura e interpretação dos problemas, ofertar novas opções tecnológicas de intervenção, e pensar a possibilidade de construção de projetos terapêuticos individualizados”.

Pereira et al. (2010), acreditam que o fato da unidade valorizar mais as ações em termos de procedimentos, de quantidade do que qualidade, observa-se uma insatisfação, tanto por parte dos usuários, como de alguns profissionais.

Espera-se que os profissionais da equipe de saúde tratem os usuários de sua comunidade com muita atenção, generosidade e carinho. Muitas vezes, as pessoas procuram a unidade simplesmente com o objetivo de serem ouvidas e compreendidas e assim terem um pouco de atenção. Atitudes assim geram um grande impacto positivo nas ações de saúde, bem como, nos indicadores de saúde. Para Backes et al., (2005, p. 427) …a ternura sinônimo de cuidado essencial significa afeto e cuidado. É um conhecimento que vai além da razão, emerge do próprio ato de existir no mundo com os outros.

Com esta microintervenção nossa equipe tem como objetivo fundamental, elaborar uma estratégia de acolhimento que permita a reorganização dos processos de trabalho da Unidade Básica de Saúde (UBS), ampliando e melhorando os fluxos de atenção aos usuários que transitam diariamente pelos nossos serviços e dessa forma obter mais acessibilidade e maior resolutividade, que é traduzido em um maior grau de satisfação do usuário.

Eu trabalho na Unidade Básica de Saúde (UBS) Vereador Joao Queiroz de Souza, localizada no município Pau dos Ferros – RN, onde atende em seu território uma população de aproximadamente 3573 habitantes, além de prestar atenção continuada a um grande número de pacientes de outras UBS vizinhas que tem um longo período de tempo sem a presença de um médico e quando estão doentes busca atender suas necessidades de saúde, independente da área de abrangência as quais estão cadastradas. A baixa cobertura médica da maioria das UBS do município dificulta de maneira geral o trabalho das unidades e o sucesso de um processo adequado de acolhimento nas mesmas. Tendo em conta esta problemática, nós motivamos cada um dos membros da equipe para fazer uma análise individual e levar a proposta de possíveis soluções para discussão coletiva e desenvolver uma estratégia que facilite melhoras no acolhimento aos pacientes. Nesta reunião, que contou com a participação de todos os Agentes Comunitários de saúde (ACS), Auxiliar de Serviços Gerais (ASG), administradora da unidade, técnica de enfermagem, Técnica de saúde bucal (TSB), enfermeira, odontólogo e médico da unidade; fizemos uma reflexão sobre como estava sendo feito o acolhimento até o momento, as principais deficiências que tínhamos nesta atividade e as possíveis mudanças para melhorar a mesma. Nosso intercâmbio evidenciou que a equipe não realiza o acolhimento com classificação de risco a partir de um protocolo ou instrumento construído de forma coletiva. Só a enfermeira, técnica de enfermagem, dentista, médico e um agente de saúde relataram que fazem avaliação da queixa, avaliam sinais vitais, investigam doenças crônicas ou recorrentes, utilização e acesso aos medicamentos, encaminhando assim para o atendimento médico, de dentista, de enfermeira, vacinas, curativos, nebulização, retirada de pontos, segundo necessidades.

Ainda, a lógica de acesso na unidade acontece predominantemente por ordem de chegada, os dias de atendimento baseado na demanda espontânea, como evidenciam as falas da administradora da unidade e a técnica de enfermagem, as quais demostraram entre outras preocupações o fato do usuário necessitar se deslocar para a unidade básica na madrugada para entrar na fila na tentativa de marcar uma consulta. Mencionei que o acolhimento pode ser feito por qualquer um dos membros da equipe e que o primordial nele é a escuta qualificada e a observância do rosto e posição ou postura do usuário que procura nossos serviços, que muitas vezes é norteador da urgência, dor e grau de sofrimento que apresenta um paciente, facilitando um atendimento levando-se em conta prioridades, o grau de sofrimento e não a ordem de chegada.

Em nossa UBS não temos recepcionista pelo qual, a maioria das vezes, a administradora da unidade é o membro da equipe que tem o primeiro contato com os usuários que vem em busca de cuidados. Ela efetiva uma escuta inicial coletiva das necessidades que tem cada usuário. Caso exista necessidade privacidade para algum usuário discorrer sobre problema, tem a facilidade de fazê-lo.

Como resultado de nosso intercâmbio de ideias e procura de soluções, acordamos que um ou dois dias da semana, um profissional da equipe fará uma palestra com tópicos de interesse e enfoque preventivo tendo em conta as principais doenças e situação epidemiológica que afeta nossa população, iniciando posteriormente o acolhimento segundo classificação de risco e tentando resolver as necessidades dos usuários no mesmo dia ou em data o mais próxima possível. Toda a equipe foi orientada sobre os serviços e a rede de apoio à estratégia de saúde da família (ESF) que temos em nosso município com o objetivo de fornecer um adequado acolhimento e acrescentar o nível de resolutividade dos problemas na atenção básica de saúde (ABS). Todos nós aprendemos muito e conseguimos consolidar o trabalho em equipe, ferramenta indispensável para obter os resultados que ajudarão á melhora da saúde de nossa população.

No processo de reorganização e aperfeiçoamento do acolhimento em nossa UBS tivemos dificuldades e potencialidades. Dentro das dificuldades podemos temos:

– Grande número de pacientes de outras UBS do território que não tem médico e procura nossos serviços.

– A cultura voltada para uma medicina centrada no curativismo ainda é bem forte na comunidade. Isto dificulta algumas implementações mais eficientes de atendimento, acesso e acolhimento por parte da equipe da UBS.

– A falta de um funcionário para a recepção também, tem sido um grande dificultador para a optimização do atendimento e consequentemente a resolubilidade do problema do usuário.

– O processo de trabalho é um pouco desorganizado, o que torna o acesso, o acolhimento e a resolutividade ineficientes.   

Como potencialidades nós tivemos:

– A presença de um quadro de profissionais qualificados e experientes.

– O conhecimento do território e da comunidade já solidificado tem facilitado um pouco a resolutividade dos casos.

– A estrutura física da UBS está dentro das normas de ANVISA.

Após esta microintervenção, as mudanças foram evidentes: A relação trabalhador-usuário melhorou muito; ficaram mais fortes as relações de trabalho entre os trabalhadores da unidade; incrementou-se o nível de conhecimento e treinamento dos membros da equipe que facilita a resolutividade dos problemas da população; incrementou-se relativamente o grau de satisfação da população; foi possível iniciar a implementação do acesso avançado em nossa UBS. Esperamos continuar aperfeiçoando o trabalho em equipe e melhorar o acolhimento diário, dando seguimento, através da opinião da população aos serviços que oferecemos. Além disto, esperamos manter a capacitação e treinamento dos membros da equipe nas reuniões mensais com o objetivo de atualizá-los com as novidades sobre acolhimento e acesso avançado.

 

                                           REFERÊNCIAS:

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea: queixas mais comuns na Atenção Básica / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 290 p.: il.-(Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume II).

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2011. 56 p.: il.-(Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume I).

BACKES, D.S. et. Al. Construção de um processo interdisciplinar de humanização á luz de Freire. Texto Contexto Enferm; v.14, n. 3, p.427-34. Jul./set; 2005.

BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Humanização SUS. v.1 Brasília, 2010.

BRASIL, Ministério da Saúde. Acolhimento nas práticas de produção de saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. -2. ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2006.

CAMPOS, G. W. S. et al, Acolhimento e (des)medicalização social: um desafio para as equipes de saúde da família. Ciênc. Saúde coletiva vol. 15 supl.3 Rio de janeiro Nov. 2010.

FRANCO, T.B. et al. O acolhimento e os processos de trabalho em saúde: o caso de Betim, Minas Gerais, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 15(2): 345-353 abr-jun, 1999.

MAMUMOTO, S.O. Acolhimento: um estudo sobre unidade básica de serviços de saúde. Ribeirão Preto: Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP, 1998.

Ministério da Saúde. ACOLHIMENTO Á DEMANDA ESPONTÂNEA. Cadernos de Atenção Básica, n.28, V.I. Paq. 19. Brasília. DF. 2013.

MINISTÉRIO DA SAUDE. Acolhimento à demanda espontânea. Cadernos de Atenção Básica, n.28, V.I. Paq. 21-22. Brasília. DF. 2013.

PEREIRA, A. D. et al. Atentando para as singularidades humanas na atenção à saúde por meio do diálogo e acolhimento. Rev. Gaúcha Enferm., Porto Alegre  v.31, n.1, p. 55-61. Mar. 2010.

SILVA JUNIOR, A.G. Lógicas de programar ações de saúde. In: Barbosa PR (Coord.). Curso de Especialização Autogestão em Saúde. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2001. P. 81-107.

 

 

 

 

 

 

 

 

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