TÍTULO: LINHA DE CUIDADO SINGULAR COMO FORMA DE ATENÇÃO INTEGRAL EM SAÚDE MENTAL EM MACAPÁ-AP.
ESPECIALIZANDO: EDER RODRIGUES NAZÁRIO
ORIENTADOR: CLEYTON CÉZAR SOUTO SILVA
A noção de Saúde Mental, diferentemente da visão patologizante da Psiquiatria, inclui a problemática da saúde e da doença, sua ecologia, a utilização e avaliação das instituições e das pessoas que a usam, o estudo de suas necessidades e dos recursos necessários, a organização e a programação de serviços de tratamento e de prevenção das doenças e de promoção da saúde (SARACENO, 2001).
Escolhidos oficialmente pelo Ministério da Saúde como estratégias para a substituição progressiva dos hospitais psiquiátricos, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) são serviços abertos que buscam como pressuposto a superação da dicotomia entre os diversos tratamentos. O CAPS congrega uma equipe multiprofissional, constituindo lugar de interlocução de vários saberes e conhecimentos, e deve estar aberto à comunidade e a seus problemas, além de contar com seus recursos (ALVES; GULJOR, 2004).
A ESF torna-se, assim, uma importante estratégia para a reinserção da pessoa com sofrimento psíquico, a partir do momento em que os profissionais percebam as famílias como responsáveis pela saúde de seus membros e não como uma simples cumpridora das determinações dos profissionais de saúde (ROSA; LABATE, 2003).
A APS desempenha importante papel no diagnóstico precoce, no início rápido do tratamento, na manutenção do tratamento farmacológico dos quadros estáveis e na reabilitação psicossocial para os quadros graves de Saúde Mental, a exemplo das psicoses. Mesmo os pacientes acompanhados por serviços especializados da Rede de Atenção Psicossocial (como os CAPS), devem continuar sendo acompanhados pela rede básica de saúde, já que, além de demandas psiquiátricas e psíquicas, esse usuário precisa continuar sendo assistido em suas necessidades clínicas (BRASIL, 2013).
Na prática, o matriciamento acontece a partir de reuniões, com discussões a respeito dos casos de Saúde Mental identificados no território pela equipe da ESF. Em algumas ocasiões específicas, poderão ocorrer intervenções em conjunto (visitas domiciliares, atendimentos) para melhor “resolutividade” do caso. A linha orientadora das ações está na qualificação das equipes da ESF para uma atenção ampliada, que apreenda o indivíduo em sua totalidade de vida, reconhecendo os casos que podem ser acompanhados nas USF, aqueles que podem ser acolhidos pelos recursos sociais existentes na comunidade ou que necessitam de um cuidado especializado em Saúde Mental (CHIAVERINI, 2011).
Voltado para a equipe de ESF do bairro Cidade Nova, na cidade de Macapá em que atuo, percebe-se um número reduzido dos usuários em uso crônico de benzodiazepínicos, antipsicóticos, anticonvulsivantes, antidepressivos, estabilizadores de humor, bem como os ansiolíticos de um modo geral.
Existe um caderno de registros feitos manualmente para seguimento desses pacientes. Normalmente quando existe algum evento agudo, O Agente de Saúde averigua as informações e realiza visita domiciliar para avaliação do meio familiar e esclarecimentos. Depois da visita domiciliar, o ACS encaminha as demandas para a enfermeira e médico, e se necessário há o atendimento domiciliar pelo médico, ou agendamento de consulta médica na UBS.
Para melhoria da qualidade da assistência prestada e para futura avaliação do PMAQ, foi elaborado uma planilha para registro e seguimento dos pacientes da Saúde Mental. Tal elaboração foi realizada no mês de julho junto com toda equipe de saúde durante as reuniões mensais estipuladas pela Matriz de Intervenção, e seguiu à risca todos os indicadores utilizados dentro do PMAQ, para um bom desempenho da equipe e atingir o objetivo de cuidar de forma integral desses pacientes. A planilha criada encontra-se em anexo ao final e também postada no Fórum do Módulo de Atenção à Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde.
Para a microintervenção desse capítulo foi escolhida uma paciente atendida em julho desse ano em primeira consulta na UBS, 48 anos de idade, divorciada, caucasiana, natural e procedente de Macapá, Ensino Médio completo, do lar, testemunha de Jeová e possui dois filhos que vivem na casa. A mesma referia queixa de tristeza profunda, cansaço constante, irritabilidade com ataques de raiva com filhos, e aumento do sono há cerca de 2 anos. Nega ter procurado atendimento médico para queixas descritas. Nega tentativas e pensamentos suicidas recentes, alucinações, fobias. Não possui comorbidades, nega uso de medicamentos e sem alergias relatadas. No decorrer da consulta quando questionada sobre possíveis fatos importantes que interferem na sua vida, a mesma se emocionou e começou a chorar. Foi feito uma pausa e paciente relatou há dois anos houve traição pelo ex-marido, e durante momento de desespero, foi tentado suicídio com medicamentos que não se recorda, com necessidade de internação e lavagem gástrica. Conta que desde então sintomas se mantém presentes em sua vida e que resolveu procurar ajuda na UBS, já que não tem mais acesso ao plano de saúde e passa por problemas financeiros por falta de pagamento da pensão alimentícia dos filhos. Ao final da consulta foi diagnosticada como síndrome depressiva, com prescrição do antidepressivo Fluoxetina 20mg 1cp pela manhã, solicitados exames de rastreamento de acordo com faixa etária, retorno com 30 dias para reavaliação médica e encaminhada para os seguintes serviços do NASF: 1º Psicologia para uma avaliação individual psicológica para uma integralidade da assistência, atuando em equipe junto com ESF. 2º Serviço Social para orientações sobre o processo de pensão e medidas cabíveis.
Durante matriciamento agendado posteriormente entre ESF e NASF com todos os profissionais envolvidos decidiu que o caso em questão necessita de uma linha de cuidado em Saúde Mental que envolve diversas áreas da atenção básica, e que a princípio não haveria necessidade de encaminhamento da demanda para demais serviços da rede de assistência à Saúde Mental, evitando sobrecarga de tais serviços, e aumentando o poder de resolutividade da Atenção Básica.
Na rede de Saúde de Mental em Macapá os atendimentos são realizados prioritamente pela Atenção Básica, por meio das equipes de ESF e NASF. Conta ainda com o centro psiquiátrico do Hospital de Clínicas Doutor Alberto Lima, o Centro de Atenção Psicossocial Casa da Gentileza (CAPS), e o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD).
Durante o mês de julho o CAPS III foi visitado, para maior conhecimento sobre a rede de Saúde Mental em Macapá. Por meio de conversa com a coordenadora, o único CAPS realmente habilitado dentro das normas exigidas pelo Ministério da Saúde é o CAPS AD, sendo que o CAPS III se encontra em fase de documentação. Existe uma média de 3000 pacientes cadastrados e não funciona 24 horas por dia como deveria. Tais usuários chegam por demanda espontânea ou encaminhados para o serviço. Existe o processo de Acolhimento e são atendidos por 2 psiquiatras. A demanda é bastante alta, com atendimentos que poderiam ser feitos dentro da UBS, tornando uma fila grande para quem busca o serviço.
Uma das dificuldades encontradas durante execução dos passos da microintervenção foi a falta de conhecimento científico dos demais integrantes da equipe de atenção básica. Como a área adscrita possui pouquíssimos pacientes da Saúde Mental, os profissionais tiveram dificuldades sobre os termos utilizados e o processo da assistência prestada, principalmente os agentes de saúde. Como solução encontrada para sanar o problema, foi realizado educação permanente sobre a Atenção à Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde com todos os profissionais, para capacitação e melhoria do processo de trabalho.
Outro problema encontrado foi a dificuldade de matriciamento para o caso em questão. A equipe de NASF atua dentro da UBS apenas no dia de sexta-feira durante todo o dia, e coincide com o meu dia de estudo para dedicação ao curso de especialização em Saúde da Família PEPSUS. Por não ceder outro espaço de tempo pela equipe de NASF, dispensei como alternativa o dia de estudos de uma sexta-feira e agendamos o Matriciamento para essa data.
Sobre potencialidades encontradas podemos ressaltar a dedicação da equipe da atenção básica em receber conhecimentos novos, que não faziam parte do cotidiano durante educação permanente.
Apesar das dificuldades, o matriciamento foi realizado de forma integral e extremamente satisfatória entrando também como potencialidades desenvolvidas, permitindo uma integração ainda maior entre ESF e NASF, fortalecendo esse braço da Rede de Atenção à Saúde Mental de Macapá.
Espera-se uma melhoria da qualidade da assistência prestada a esses usuários dentro da atenção primária, seja por meio da planilha de acompanhamento, ou por meio do processo de matriciamento com reuniões para o compartilhamento de conhecimento, elaboração de estratégias para o plano de cuidado integral e a tomada de decisões em grupo.
REFERÊNCIAS
ALVES, D. S.; GULJOR, A. P. O Cuidado em Saúde Mental. In: PINHEIRO, R.; MATTOS. R.A (Org.). Cuidado: as fronteiras da integralidade. São Paulo/Rio de Janeiro: Hucitec, 2004. p. 221-240.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde Mental. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 176 p. (Cadernos de Atenção Básica, n. 34)
CHIAVERINI, D. H. et al. (Org.). Guia prático de matriciamento em Saúde Mental. Brasília: Ministério da Saúde; Centro de Estudo e Pesquisa em Saúde Coletiva, 2011. 236 p.
ROSA, W. A. G.; LABATE, R. C. A Contribuição da Saúde Mental para o desenvolvimento do PSF. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 13, Supl., p. 230-235, 2003.
SARACENO, B. Libertando identidades da reabilitação psicossocial à cidadania possível. 2. ed. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: Te Corá, 2001.
ANEXOS
Ponto(s)