Especializanda: Kelly Karine Fraga Vieira
Orientadora: Romanniny Hevillyn Silva Costa Almino
Acolhimento e demanda espontânea
Relato de Experiência
O acolhimento é um arranjo tecnológico que busca garantir acesso aos usuários com o objetivo de escutar todos os pacientes, resolver os problemas mais simples e/ou referenciá-los se necessário (SCHIMITH; LIMA, 2004).
Acolher, como definição, significa aceitar, receber, amparar, apoiar e, portanto, manifesta uma ação de aproximação, de “estar próximo”, um ato de inclusão.
Segundo Brasil (2004), o acolhimento é um processo constitutivo das práticas de produção e promoção de saúde, que implica responsabilização da equipe pelo usuário, desde a sua chegada até sua saída, ouvindo sua queixa, considerando suas preocupações e angústias, fazendo uso de uma escuta qualificada, que possibilite analisar a demanda e, colocando os limites necessários, garantir atenção integral, resolutiva e responsável.
Ao acolher, buscamos relações interpessoais com base na empatia – diretriz ética da Política Nacional de Humanização do SUS! Ética no sentido de compromisso em entender e dividir as responsabilidades seja nas diferenças, nas dores, nas angústias, nas dúvidas, nas alegrias como nos planos de felicidade daqueles que procuram nossa assistência para si ou familiar (ESTECHE, 2018).
A ação de acolher é diferente e bem maior que simplesmente triar. Só o acolhimento permite a inclusão, pois avalia sob a ótica das vulnerabilidades e organiza as demandas programadas e as imprevistas. Diferente da triagem que tem como objetivo a exclusão: “quem não deveria estar aqui” (ESTECHE, 2018).
O acolhimento com classificação de risco é uma ferramenta que, além de garantir atendimento imediato do usuário com grau de risco elevado, propicia informações aos usuários sobre sua condição de saúde e o tempo de espera; promove o trabalho em equipe; melhora as condições de trabalho aos profissionais de saúde por meio da discussão da ambiência e implantação do cuidado horizontalizado; aumenta a satisfação dos usuários e fomenta a pactuação entre os serviços da rede assistencial (BRASIL, 2009).
Os primeiros dias de implantação do acolhimento com classificação de risco na minha Unidade Básica de Saúde – UBS foram bem difíceis, tanto pela dificuldade de os funcionários acolherem inúmeros usuários, quantopela resistência dos pacientes de serem reagendados em queixas consideradas menos urgentes. Um paciente que procura a unidade de forma espontânea por achar que precisa de um “exame de rotina” ou para “trocar uma receita vencida” pode ser encaminhado para o agendamento programado, e não necessariamente ser atendido naquele momento, principalmente se a demanda espontânea do dia estiver sobrecarregando o serviço.Sob essa ótica, percebemos o quão enorme é o grau de insatisfação do paciente ao procurar a Unidade Básica de Saúde (UBS) em busca de uma consulta médica naquele momento e, por ser um caso pouco urgente, é agendado para outro dia.
Ao procurarem a UBS os pacientes almejam ser atendidos no mesmo dia, o que muitas vezes não é possível devido à grande demanda, sendo necessário a avaliação caso a caso e classificando de acordo com as queixas apresentadas. Infelizmente não podemos atender toda a demanda diária, pois se assim fosse, perderíamos a qualidade do atendimento e o principal objetivo da atenção básica que é atuar na prevenção e promoção de saúde.
Percebe-se que são vários os fatores que podem interferir na prática do acolhimento, tais como, a inadequação da área física, a maior sobrecarga de trabalho, o pouco apoio institucional às experiências novas e a redução/inadequação das atividades de prevenção. Outras dificuldades são relevantes: a demanda excessiva de usuários; a falta de médicos nas instituições de saúde; a dificuldade de acesso dos usuários às consultas especializadas e odontológicas; a demanda reprimida de usuários e a falta de medicamentos e materiais (BECK; MINUZI, 2008).
Em nossa Unidade Básica de Saúde Senador Hélio Campos o acolhimento, baseado no protocolo de Manchester (ilustrado na tabela abaixo), funciona da seguinte forma: o médico e o enfermeiro acolhem pela manhã das 08:00 as 09:30 e pela tarde das 14:00 as 15:30. Após os horários do acolhimento o médico começa a atender os pacientes agendados. A demanda diária que procura atendimento médico é quase sempre de 30 pacientes por turno. Procuramos agendar 8 pacientes por dia, não ultrapassando o período de 7 dias para o atendimento médico desses pacientes agendados.
Considerando-se que o Sistema Único de Saúde (SUS) objetiva promover uma abordagem integral do indivíduo e que há uma crescente demanda nos serviços de atenção básica, é necessário buscar alternativas que priorizem o atendimento àqueles usuários com maior gravidade, no sentido de diminuir os riscos advindos do tempo de espera para o atendimento (BRASIL, 2004).
Ressalte-se, assim, a importância da implantação da classificação de risco, que consiste em um processo dinâmico que visa identificar os usuários que necessitam de cuidados imediatos, de acordo com o potencial de risco, os agravos à saúde ou o grau de sofrimento, viabilizando um atendimento rápido e efetivo.
Assim, percebemos que o processo de acolhimento é fundamental e necessário para organizar os fluxos e os contrafluxos dos usuários pelos diversos pontos de atenção à saúde (BRASIL, 2010). E como a atenção básica representa porta de entrada à comunidade aos serviços de saúde é essencial proporcionar atendimento acolhedor para diminuir as desigualdades e promover cuidado integral à comunidade.
REFERÊNCIAS
BECK C.L.C., MINUZI, D. O. Acolhimento como proposta de reorganização da Assistência à saúde: uma Análise Bibliográfica. Saúde, Santa Maria, vol. 34a, n 1-2, p 37-43, 2008.
BRASIL. Ministério da Saúde. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Diretrizes e normas regulamentadoras para pesquisa envolvendo seres humanos: resolução CNS 466/12 e outras. 2012. Disponível em: http:// conselho.saude.gov.br/resoluções/2012/Reso466.pdf>.
BRASIL. Ministério da Saúde. Humaniza SUS: acolhimento com avaliação e classificação de risco: um paradigma ético-estético no fazer em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2004.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Acolhimento e Classificação de risco nos serviços de urgência. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279 de 30 de dezembro de 2010. Dispõe sobre para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Conselho Nacional de Saúde – Ministério da Saúde, 2010.
ESTECHE, F. F. Acolhimento à Demanda Espontânea e à Demanda Programada. Programa de Educação Permanente em Saúde da Família, 2018.
SCHIMITH, M.D.; LIMA M.A.D.S. Acolhimento e vínculo em uma equipe do Programa Saúde da Família. Cad. Saúde Pública, vol. 20 n. 06, p.1487-94, 2004.
Ponto(s)