Os desafios no cuidado das doenças crônicas não transmissíveis.
O atendimento de pacientes com doença crônica não transmissível é um grande desafio para nossa equipe. Desde o início do trabalho na equipe, no início desde ano, este tem sido um ponto discutido nas reuniões, e as dificuldades de se estabelecer uma rotina de cuidado efetiva e abrangente são muitas.
O desafio se inicia na conscientização dos pacientes, pois, por serem doenças crônicas, requerem maior disciplina e algumas abdicações durante o tratamento. O controle de doenças como diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica e obesidade exige uma alteração do estilo de vida do paciente, que vai desde a adoção de hábitos mais saudáveis, até a utilização de múltiplos medicamentos, o que pra muitos é considerado um transtorno. Iniciar e, principalmente, manter uma rotina de vida mais saudável muitas vezes não é valorizado pelo paciente, e por ser contrário à rotina que o paciente levou durante toda a sua vida, é de grande dificuldade convencê-lo da real importância dessas mudanças.
Outro fator influente nesse sentido é o próprio conhecimento do paciente sobre sua doença, principalmente por lidarmos com uma população predominantemente de baixa renda e escolaridade. É comum durante o atendimento, ao serem questionados sobre a adesão ao tratamento medicamentoso, os pacientes responderem que apenas tomam o medicamento quando estão sentindo algum mal-estar ou “dor de cabeça”, outros ainda chegaram a iniciar o tratamento, mas por estarem assintomáticos, acreditam que estão curados e, por isso, abandonam o medicamento. Essa visão limitada a respeito da gravidade de suas condições também reduz a busca por atendimento ou o comparecimento às consultas previamente agendadas.
No que diz respeito ao processo de trabalho da equipe, a falta de organização e registro de dados (cadastro e seguimento) e de controle dos hipertensos e diabéticos da área dificulta a visualização do panorama dessas condições da comunidade e consequentemente limita a capacidade de ação e resolutividade da equipe.
Atualmente o atendimento dos hipertensos e diabéticos se dá através de consultas agendadas e das visitas domiciliares. Foi orientado aos Agentes Comunitários que priorizassem, no agendamento das visitas domiciliares, além dos acamados, os hipertensos e diabéticos de difícil controle ou com má adesão ao tratamento, para que pudéssemos ter maior contato e melhor seguimento desse grupo. Para os pacientes de primeira vez ou os que já fazem acompanhamento, porém de forma irregular, na primeira consulta é colhida uma anamnese minuciosa e são solicitados exames em busca de lesões de órgãos alvo ou outras comorbidades, além de auxiliar na classificação de risco e levantamento de metas terapêuticas. Encaminhamentos são realizados de forma oportuna. De acordo com o grau de controle da doença, então, esses pacientes têm seu retorno agendado e em cada consulta é reforçado a necessidade desse acompanhamento para evitar as complicações agudas e crônicas dessas condições.
Entretanto, essa forma de atendimento ainda está longe de ser a ideal para uma atenção holística desse grupo. Então, buscando avaliar os pontos mais frágeis do nosso processo de trabalho, foi respondido o questionário de prioridades do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ), o qual pode ser encontrado no Anexo 2. A partir da análise do questionário, pudemos perceber que as maiores lacunas se encontram no processo de levantamento e organização dos dados para acompanhamento desses pacientes. Não possuímos instrumentos de classificação de risco dos pacientes, então as consultas acontecem, na sua maioria, por meio da demanda dos próprios pacientes, quando deveríamos priorizar os de maior risco.
A partir da identificação das necessidades de intervenção, criamos um plano de ação para a realização de mudanças compatíveis com a realidade da nossa equipe. Percebemos que para iniciar qualquer ação precisaríamos ter a real noção do panorama dessas doenças na nossa comunidade, e para isso, tínhamos que contar com dados atualizados e criar um instrumento para mantê-los assim.
Existe na equipe um livro de cadastro voltado para o programa HIPERDIA, entretanto é pouco utilizado. Foi então pactuado que esse livro seria levado nas visitas domiciliares para que pudéssemos alimentar esses dados constantemente. Além de ser utilizado pelas técnicas nos dias de atendimento ambulatorial do HIPERDIA, juntamente com a médica e a enfermeira. Nesse livro consta a data de atendimento, dados antropométricos, medida da pressão arterial e glicemia capilar, medicações em uso (nome e doses) e conduta resumida. Além disso, será anotada a cada consulta, a classificação da hipertensão, e realizado no decorrer das consultas subsequentes o cálculo do risco cardiovascular adicional, o que norteará os próximos atendimentos, através da definição de metas terapêuticas e priorização dos pacientes de alto risco. A lista dos casos de maior gravidade será repassada também aos agentes de saúde, para que mantenham maior vigilância.
A equipe iniciou também o processo de recadastramento dos seus usuários, em busca de atualização dos dados da população em geral, mas com enfoque nos grupos prioritários, como crianças, hipertensos, diabéticos, tabagistas, dentre outros. Esse processo é o passo inicial para a organização do trabalho da equipe. Sem dados atualizados, não podemos mensurar a resolutividade da equipe e, consequentemente, dificulta traçar planos de trabalho eficazes para sanar os déficits encontrados. A partir do levantamento desses indicadores, poderemos realizar novas reuniões e definir novas ações, como a instituição de um grupo de apoio a hipertensos e diabéticos.
Algumas lacunas ainda não puderam ser preenchidas por questões estruturais, como a ampliação da agenda ambulatorial para o programa HIPERDIA, a realização do exame de pé diabético e de fundo de olho, já que nossa unidade ainda não conta com os aparelhos para a realização de tais testes.
Ainda há muito que realizar para conseguirmos contemplar todas as prioridades levantadas pelo PMAQ e assim melhorar o acesso à saúde da nossa comunidade. É um trabalho gradual que deve ser sempre repensado e coordenado para que as mudanças instituídas não sejam perdidas ou abandonadas. Precisamos ainda de maior interação e colaboração entre a equipe, para que seja cumprido o que foi pactuado, pois só assim teremos resultados consistentes e garantiremos o cumprimento do nosso papel de garantir adequado acesso à saúde para nossa comunidade.
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